Carregando minha pasta do trabalho, repleta de processos da vara da família, entrei em casa e desfiz a gravata. Minha esposa estava deitada na cama, assistindo algum programa da TV a cabo e bebendo vinho branco. Ao perceber minha presença, ela disse, sem tirar os olhos da TV, você precisa de férias! Está com a cara péssima, deve ser cansaço. Percebi que meus filhos estavam em casa, há barulho de rock e de videogame. Você não vai guardar essa pasta? Perguntou minha esposa; tira essa roupa social, bebe uma taça de vinho, você vai se sentir melhor.
Fui ao escritório, onde gostava de ficar sozinho, sem barulho, e de vez enquanto, organizava meus processos. Abri um livro de história, no capítulo sobre as grandes guerras da nossa civilização, mas apenas folhei as páginas, não vi as imagens e nem as letras. Esperei. Você trabalha demais, seus colegas não se dedicam tanto ao trabalho como você e ainda ganham a mesma coisa. O jantar está sendo servido. Comenta minha esposa.
A empregada servia o jantar. Minha esposa bebia a quarta taça de vinho e meus filhos me cobravam a mesada do mês que esqueci de depositar na conta deles.
A novela começou e a minha diversão também: convidei minha esposa para passear de carro na orla da Prainha Grande. Eu tinha certeza de que ela não ia. Não há diversão em passear todas as noites de carro pela orla, pois a brisa do mar torna-se artificial devido ao ar condicionado do carro. Minha esposa respondeu. Então, decidi seguir meu caminho.
Fui à garagem. Não havia ninguém. Abri o porta-malas do meu carro e peguei uma pequena caixa preta que estava ao lado da minha maleta de ferramentas. Abri lentamente a caixa para contemplar a minha preciosidade que ali estava bem guardada. Uma pistola, uma das melhores do mundo, que bem usada, funciona como uma sub-metralhadora. Minuciosamente, acariciei e a coloquei em minha cintura. Abri o portão da garagem. Entrei no carro e pensei: está na hora de sair à caça! Observei a rua e fechei o portão da garagem. Fui em direção a orla da Prainha Grande, lá não há muita iluminação (só quando a lua está cheia, atrapalhando os meus planos.), só alguns pescadores que pescam nas pedras que ficam entre o acostamento e o asfalto, esses homens, na maioria das vezes, compartilham suas solidões com os candeeiros e as varas de pescar. O lugar era perfeito! Só em pensar nisso, senti o coração palpitando e a emoção aumentando ainda mais, quando de longe, vi uma luzinha de candeeiro e a sombra de um homem erguido. Jovem ou velho? Não importa. Pois a sensação era a mesma. Diminui a velocidade e desliguei os faróis. Parei cerca de 100m de distância, o pescador estava de costas, não percebeu o ritmo do meu coração e nem notou a minha respiração ofegante. Tirei a arma do seu aconchego, mirei precisamente na cabeça do pobre animal e atirei. A bala corria como um carro de fórmula 1, em uma velocidade média de 170km/h ao ponto de chegada e, enfim, vencemos! O ser racional ajoelhou-se e em seguida caiu no penhasco abaixo, em silêncio e imóvel, para servir de comida para os outros animais, uma maneira de propagar a teia alimentar. Aproximei-me das pedras, só para conferir o êxito da minha caçada. Tive êxtase em ver o corpo boiando e seguindo o seu caminho no alto mar.
Estacionei o carro na garagem. Abri orgulhosamente o porta-malas do meu carro e peguei o baú preto. Embrulhei o meu tesouro em um lenço dourado e o guardei com muita satisfação.
Todos ainda estavam na sala, assistindo à última cena da novela, percebi por meios dos comentários. Você está mais calmo! A cada dia que passa esses passeios estão lhe fazendo bem. Afirmou minha mulher. É, acho que sim. Respondi, vou dormir, amanhã tenho muito processo para analisar. Boa noite.
Produzido por: Mirlene Coutinho
Boas leituras!
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