Literatura está intimamente relacionada com práticas sociais. Nesse sentido, propomos uma gama de correlações entre as diversas manifestações literárias e a sociedade contemporânea. Assim, buscaremos no espaço social elementos que interajam diretamente com a arte literária.

Dessa forma, este blog objetiva analisar e expor elementos da realidade social, fazendo um contra ponto com a literatura e seus modos de encarar a realidade e a cultura das diversas épocas da sociedade.

Esperamos de você leitor a interação e a sugestão de novos temas, a discordância ou a concordância com as críticas aqui relacionadas, tendo em vista que pensar em Literatura não é apenas propor teorias literárias, mas sim promover a crítica à sociedade, tentando encontrar elementos que sejam favoraveis ou não à nossa formação enquanto leitores e apreciadores de leitura e cultura. Assim, este espaço é destinado aos professores de Língua Portuguesa e Literaturas, graduandos de Letras, alunos do nível médio e ao público que gosta de uma leitura crítica acerca dos assuntos que envolvam a sociedade.

Boas leituras!

sábado, 29 de março de 2014

PROJETO AROMA LITERÁRIO, SARAU POÉTICO
ORGANIZADORA 
Profa. Especialista Maria da Conceição
A palavra Sarau vem do latim seranus, através do galego serão e consiste em um evento cultural onde se expressam manifestações artísticas de dança, poesia, música, teatro e até mesmo arte e pintura. Diante disso, o Projeto Aroma Literário, Sarau Poético visa revisitar a performance artística e literária do universo poético dos seguintes autores: Patativa do Assaré, Carlos Drummond de Andrade, Luiz Gonzaga e Vinícius de Moraes, misturando canção e poesia, a fim de promover o acesso a cultura e comemorar o Dia da Poesia, 14 de março.
OBJETIVO
Incentivar a leitura e interpretação oral, por meio da expressividade sugerida pela poesia e pela música.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Ø  Promover acesso à cultura popular, poética e musical.
Ø  Incentivar a pesquisa sobre cultura, literatura, poesia e música dentro do contexto social brasileiro.
Ø  Refletir sobre temas sociais, políticos, amorosos e regionais, por meio do recital de poesias.
Ø  Possibilitar ações de interação entre os discentes, a fim de que juntos consigam ler e interpretar poesias e músicas.
Ø  Facilitar o processo de socialização de conhecimentos, por meio da interação entre os discentes.
Ø  Comemorar o dia da poesia;
Ø  Comemorar o Centenário de Vinícius de Moraes;
Ø  Homenagear os autores Patativa do Assaré, Carlos Drummond de Andrade e Luiz Gonzaga.
CONTEÚDOS
6° ano: Poemas de Patativa do Assaré.
7° e 8° ano: Poemas de Carlos Drummond de Andrade.
9° ano: Canções de Luiz Gonzaga.
1° ano: Canções de Vinícius de Moraes.
2° ano: Poemas de Vinícius de Moraes.
TEMPO
O tempo destinado ao evento será combinado com a coordenação no dia 05/02.
MATERIAL
Sites, livros de poesias e letras de músicas dos autores sugeridos  para o conhecimento da obra (recital)
Cenário: A definir
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES
De 18/02 a 22/02: Separação dos grupos e solicitação de pesquisa sobre poemas e/ou músicas dos autores sugeridos.
Dia 25/02 a 27/02: Distribuição de poemas e canções por grupo.
Dia 12/03 Checar espaço (Cenário) e ver o andamento dos grupos.
Dia 14/03 Sarau Poético.
METODOLOGIA 
A metodologia empregada para a realização do Projeto Aroma Literário, Sarau Poético é a pesquisa da Biografia dos autores sugeridos; separação dos grupos com, no máximo, 4 componentes; divisão de poesias e/ou canções por grupo, podendo cada grupo ficar com, no máximo, dois poemas, no caso das turmas de 6° a 8° ano do Ensino Fundamental, 2° ano do Ensino Médio e uma canção por grupo, no caso das turmas do 9° ano do fundamental e 1° ano do médio. Diante disso, a expressão interpretativa do discente refletirá sua intimidade com o poema ou música estudados.
AVALIAÇÃO
A avaliação deverá ser realizada pelos professores das turmas. É sugerido que, para incentivar a participação dos alunos, essa atividade some pontos para a nota do 1° Bimestre. Diante disso, a avaliação deverá ser feita de acordo com o desempenho e participação do discente  no evento.


De olho na escrita

DICA GRAMATICAL
Ao encontro de / De encontro a

Você sabe quando usar os parônimos "ao encontro de" e "de encontro a"? Não? Veja a diferença e a aplicabilidade de cada uma dessas expressões a seguir.

Ao encontro de equivale a "favorável a".
Exemplo: Os estudantes foram ao encontro das propostas feitas pelos lideres de sala.

De encontro a equivale a "contra".
Exemplo: Sempre encontramos opiniões que vão de encontro ao que sonhamos.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Procura da Poesia

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

Carlos Drummond de Andrade
Cabeludinho

Quando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresentou aos amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e voltou de ateu. Ela disse que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada ma fantasiava de ateu. Como quem dissesse no Carnaval: aquele menino está fantasiado de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério. Mas todo mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer de uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza nas palavras é uma solenidade de amor. E pode ser instrumento de rir. De outra feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse, Cabeludinho. Eu não disiliminei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe um perfume de poesia à nossa quadra. Aprendi nessas férias a brincar de palavras mais do que trabalhar com elas. Comecei a não gostar de palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar. Aprendi a gostar mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que elas informam. Por depois ouvi um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena, não me escreve/ que eu não sei a ler. Aquele preposto ao verbo ler, ao meu ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro. 
Manuel de Barros

Dica de leitura

O médico e o monstro
  

          A obra O médico e o monstro, escrita em 1886, por Robert Louis Stevenson, nasceu de um pesadelo e apresenta uma visão aprofundada dos conflitos da natureza humana. Dessa forma, as forças do bem e do mal, existentes na essência do homem, ganham um valor alegórico para que a discussão acerca de tais temas e suas consequências para a sociedade sejam abordados, bem como a forma como o próprio indivíduo se sente ao deixar aflorar um dos lados da sua personalidade.

            Dessa maneira, em uma narrativa recheada de mistério, Dr Henry Jekyll conta que, por meio de pesquisas, descobriu uma porção capaz de realizar a separação da personalidade em seus lados positivo e negativo, psicológica e fisicamente. Essa porção transforma o Dr Jakyll em Mr Hyde, tornando-o um ser repugnante, mas que causa admiração em Jakyll, porque foge de todas as convenções éticas propostas pela sociedade e pela medicina.

quarta-feira, 12 de março de 2014

O caçador de palavras
[...] Foi por causa de minha mania de ir ao cinema que tudo aconteceu. Naquela noite, eu estava cansado. E o filme era bem aborrecido, para dizer a verdade. Só fiquei para a segunda sessão porque estava chovendo, e não queria molhar os sapatos. Nos primeiros dez minutos de filme, adormeci. Meu corpo escorregou da cadeira, e dormi tão confortavelmente como em minha cama.
Acordei em plena escuridão e silêncio. No início, nem sabia onde estava. Aos poucos, meus olhos foram se acostumando com a falta de luz. Vi a tela branca, o letreiro de saída apagado. Não entendi, imediatamente, o que estava acontecendo. Levantei atordoado. Com dificuldade, empurrei a porta de entrada. Pesada. Saí do saguão. Só então percebi o que havia acontecido: haviam esquecido de mim no cinema. Completamente. Talvez não tivessem me visto. Olhei o relógio, estava no meio da noite.
Quis telefonar. Fui até o escritório, estava trancado. Pensei em quebrar o vidro. Nunca senti tamanho desespero.
É incrível como um cinema vazio, à noite, pode ser tétrico. Olhava para as paredes, via sombras. Ouvia ruídos. Ao mesmo tempo, tentei raciocinar. Arrombar a porta, ou qualquer coisa do tipo, poderia terminar em confusão. Chamar a polícia também: como explicar minha presença, se todos pensariam, no primeiro instante, que eu era um ladrão? O ideal, sem dúvida, era aguardar algumas horas, e esperar, pacificamente, que alguém viesse abrir o cinema. Poderia, então, sair calmamente. Como passar aquelas horas difíceis? Foi quando vi, no canto do balcão da doceria, ajudando a apoiar uma lata, um livro grosso. Fui até ele. Peguei. Era bem pesado.
Saí do saguão, onde só entrava a luz do luar, e fui ao banheiro. Acendi a luz. No hall de entrada que levava aos dois toaletes, havia um sofazinho velho. Sentei, e abri o livro. Era um dicionário com a origem e o significado das palavras. No primeiro instante, pensei:
– Bem que eu preferia um livro policial!
Puro engano. Só para me distrair, comecei a folheá-lo. Pouco a pouco, fui sendo envolvido pelo universo fascinante das palavras. Elas começaram a brilhar para mim como estrelas no céu. Da mesma forma que todas as pessoas, sempre vivi cercado por verbos, substantivos, adjetivos. Com eles, dei forma a sentimentos, expressei vontades, descobri risos, comuniquei emoções. Mas, assim como não se pensa conscientemente nos dedos cada vez que se pega um garfo, também não me detinha nas palavras. Elas faziam parte de mim como os olhos, os cabelos e as unhas. Eram tão enredadas no cotidiano como o elevador do prédio, o ônibus, o cartão de ponto. Apesar de fluírem através da vida com tanta facilidade quanto o ar que respirava, as palavras eram um instrumento que eu usava mecanicamente.
De repente, tudo mudou.
Naquela noite, descobri que as palavras guardam histórias. Percorrem os tempos, registrando emoções, atravessam vidas. Entendi, pela primeira vez, o fascínio dos poetas ao brincar com elas, criando versos e rimas que trazem os sons das marés, a cadência dos sentimentos, o colorido das primaveras. A paixão de quem faz letras de músicas, sonoras por si sós, onde as palavras remetem umas às outras, dançam entre si. Senti o encanto dos escritores, que as usam para criar mundos e vidas, como se fossem bilhetes para viagens fulgurantes. E, então, eu também me apaixonei, porque descobri, mais que tudo, o quanto as palavras são vivas.
[...]
(Walcyr Carrasco. São Paulo, Ática, 1994. P. 8 a 11.)


A Máquina do Mundo 
E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,
a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.
Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável
pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar
toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera
e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,
assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco o simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,
a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
“O que procuraste em ti ou fora de
teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,
olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,
essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo
se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste… vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”
As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge
distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos
e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber
no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar
na estranha ordem geométrica de tudo,
e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que tantos
monumentos erguidos à verdade;
e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,
tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.
Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,
a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;
como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face
que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,
passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes
em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,
baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.
A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,
se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mão pensas.
Carlos Drummond de Andrade