Literatura está intimamente relacionada com práticas sociais. Nesse sentido, propomos uma gama de correlações entre as diversas manifestações literárias e a sociedade contemporânea. Assim, buscaremos no espaço social elementos que interajam diretamente com a arte literária.

Dessa forma, este blog objetiva analisar e expor elementos da realidade social, fazendo um contra ponto com a literatura e seus modos de encarar a realidade e a cultura das diversas épocas da sociedade.

Esperamos de você leitor a interação e a sugestão de novos temas, a discordância ou a concordância com as críticas aqui relacionadas, tendo em vista que pensar em Literatura não é apenas propor teorias literárias, mas sim promover a crítica à sociedade, tentando encontrar elementos que sejam favoraveis ou não à nossa formação enquanto leitores e apreciadores de leitura e cultura. Assim, este espaço é destinado aos professores de Língua Portuguesa e Literaturas, graduandos de Letras, alunos do nível médio e ao público que gosta de uma leitura crítica acerca dos assuntos que envolvam a sociedade.

Boas leituras!

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

VIDA DUPLA

Cheguei em casa carregando uma pasta cheia de intimações, papéis e estudos. Minha mulher assistia ao capítulo da novela, tomando uma taça de vinho, disse sem tirar os olhos da tela, você está com uma cara de preocupação, ocorreu algo? Eu apenas respondi, cansado. No quarto ao lado, minha filha teclava com uma amiga e o barulho do controle do Playstation vinha do quarto do meu filho. Você não vai tomar um banho para jantarmos juntos hoje? Perguntou minha mulher; tira essa gravata, toma um banho relaxante e eu e as crianças te esperamos lá em baixo na sala de jantar.
Fui para a biblioteca, único lugar onde podia ficar tranquilo e não ouvir  barulho algum. Coloquei a pasta sobre a mesa, sentei na poltrona em frente aos livros e, por um instante, cochilei. Querido, o jantar está servido, compartilhe conosco, disse minha mulher batendo na porta da biblioteca. Aguarde um momento, preciso tomar um banho.
Ao chegar à sala, minha família me esperava. A copeira servia o jantar. Meus filhos cresceram e eu e minha mulher estávamos velhos. Experimenta, é aquele suco de abacaxi com hortelã que você gosta. Disse minha mulher. Meus filhos nada diziam, apenas comiam e nos olhavam enigmaticamente.
Vamos dar uma volta? Convidei. Eu sabia que ela não ia, era hora de passar todos os cremes antirrugas. Não sei qual é a graça de sair para passear debaixo de chuva, também, aquele carro custou os olhos da cara, tem de ser usado mesmo, prefiro ficar e cuidar da minha pele. Respondeu.    
Tirei o carro, coloquei os cachorros para dentro, fechei o portão e entrei no carro. Colocar os cachorros para dentro de casa me deixou chateado, mas me alegrei ao ver que a chuva havia passado. Enfiei a chave na ignição, era um motor potente, silencioso, escondido no capô aerodinâmico. Saí como sempre para uma badalada rua de prostituição no Rio de Janeiro. Parei o carro em uma rua antes para que ninguém me visse ou gravasse a placa. A rua era mal iluminada, cheia de lojas fechadas, bares e cabarés. Mulheres! Muitas mulheres para que eu escolhesse minha vítima naquela noite. Ela caminhava desengonçada, com roupas nojentas, curtas e completamente sem classe. Era ela que eu usaria para descarregar toda a minha adrenalina. Saímos. Fomos para o carro. Para onde você está me levando? Perguntou  ela meio assustada. Para um lugar inesquecível, respondi. Ela segurava inquieta sua bolsa minúscula e mascava um chiclete meio branco e gasto.
Chegamos. Aqui? Então, senhor, o que vai querer hoje? Perguntou-me com uma voz trêmula. Quero que desça e em frente ao carro faça um strip. Mas...? Principiava a questionar. Mas nada, desça. Ordenei. A estrada era escura, não havia nada a não ser o cheiro de terra molhada e o desfiladeiro ao lado. Ela desceu e quando estava bem na frente, acelerei o carro acertando-a em cheio. Ela caiu no desfiladeiro gritando.
Segui para casa. Cheguei, entrei, coloquei os cachorros para dentro, fechei o portão, examinei o carro, tudo perfeito, entrei em casa.
Meus filhos jogavam paciência na mesa da sala e minha mulher dormia no sofá com a cara cheia de um creme verde. Vou dormir, amanhã, tenho muitas intimações para entregar.

Produzido por: Conceição Cavalcanti

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